Pular para o conteúdo

Piscicultor se torna referência ao adotar sistema inovador

    Piscicultor se torna referencia ao adotar sistema inovador

    Sob a estufa de 1.000 metros quadrados localizada em um sítio em Apucarana, no Noroeste do Paraná, estão oito tanques com capacidade combinada para 600 metros cúbicos de água. É nesses reservatórios que, desde 2017, o piscicultor Flávio Cesar Urizzi, da SJ Fish, cultiva juvenis de tilápia – estágio posterior aos alevinos – com uma tecnologia conhecida como bioflocos, em um raro sistema de produção que possibilita o reaproveitamento da água . Superintensivo, o modelo permite ciclos de produção mais curtos e cria maior volume de peixes em menor espaço. Urizzi pode produzir 600.000 juvenis em ciclos entre 30 e 60 dias.

    Peça fundamental do sistema de produção adotado pela Urizzi, os bioflocos são partículas orgânicas colocadas nos tanques e que ficam suspensas nos viveiros. Nesses compostos, desenvolvem-se organismos microscópicos, como fungos, microalgas e bactérias heterotróficas, que atuam como uma espécie de sistema de filtragem natural. A água assume uma cor marrom mais escura. A ação de microrganismos também transforma impurezas e efluentes em substâncias benéficas para os peixes.

    Patrocinadores

    “Tudo isso requer mais gestão. Tem que haver uma medição diária da quantidade de flakes, por exemplo, além de gerar continuamente oxigênio no sistema. Mas este modelo permite que você reutilize a água constantemente. É sustentável”, explica Urizzi. Além dele, três funcionários trabalham no negócio. Na hora da separação do pescado, ele precisa contratar mais dois trabalhadores temporários.

    O modelo também é ideal para pequenas propriedades, como é o caso da área que Urizzi tinha disponível quando optou por investir na piscicultura – o espaço correspondia a um aviário desativado. Além disso, o sistema de bioflocos permite maior controle em relação a outros modelos de produção, reduzindo a mortandade dos peixes. Os aquários SJ Fish, por exemplo, recebem os filhotes e os desenvolvem até a fase juvenil. Os peixes saem do tanque pesando entre 10 e 40 gramas, vendidos para outros piscicultores, principalmente os que trabalham com tanques escavados ou tanques-rede.

    Patrocinadores

    “Os jovens são sensíveis. Se houver uma variação de temperatura de seis graus, já causa perdas. Em tanques escavados, de 10.000 alevinos, apenas 2.000 atingirão os juvenis. A produção é incerta. No sistema de bioflocos, temos um controle que minimiza a mortalidade”, aponta Urizzi. “Por isso, os produtores de tanques cavados têm preferido comprar peixes já na fase juvenil”, explica.

    Outra vantagem diz respeito à densidade. Nos tanques escavados convencionais, a capacidade produtiva varia entre quatro e cinco quilos por metro cúbico. Em sistemas com aeradores, a densidade média aumenta para oito quilos por metro cúbico. Já no modelo de bioflocos é possível cultivar até 25 quilos de peixe por metro cúbico de água. Isso porque, além do controle da qualidade da água, os tanques contam com sistema de oxigenação, ventiladores que permanecem ligados continuamente e arejadores acionados conforme a necessidade.

    “Isso permite uma criação intensiva. Como o ambiente é controlado, os peixes crescem mais saudáveis ​​e em um ciclo mais curto. Se fosse em um tanque escavado, o ciclo levaria 100

    a 120 dias. Produzimos na metade desse período”, diz o piscicultor. “E nossa água vem de minas e é reaproveitada constantemente. Se tivéssemos o mesmo volume de produção em tanques escavados, precisaríamos de 1,2 hectares de lâmina d’água”, explica. Com o reaproveitamento da água, a Urizzi se livra de um problema constante no Paraná: a escassez de água. Segundo o Instituto de Águas e Terras (IAT), há 6.200 outorgas de uso de água em vigor no Estado e 655 pedidos estão em fila de espera.

    Como se pode supor, o modelo de produção demanda intenso consumo de energia. Por isso, a Urizzi investiu em um painel fotovoltaico, com 120 placas, que produz 60% da energia consumida na produção de juvenis da SJ Fish. A intenção do produtor é, assim que o financiamento for quitado, fazer um novo investimento, para que 100% do consumo de energia da unidade seja de matriz renovável.

    O modelo em números
    – 7 tanques de 70 m³
    – 1 tanque de 160 m³
    – 600 m³ de água, da mina
    – Produção de até 600.000 juvenis de tilápia por ciclo
    – Os juvenis saem dos tanques com peso entre 10 e 40 gramas
    – Ciclo de produção de 30 a 60 dias
    – Densidade produtiva de até 25 quilos por m³
    – 120 painéis fotovoltaicos, que produzem 60% da energia consumida no sistema

    Da informática à referência na piscicultura

    Até 2017, Urizzi ficou afastado da produção rural. Até então, seu foco era o mundo digital. Com dois diplomas na área de tecnologia da informação, Urizzi construiu uma carreira desenvolvendo sistemas para bancos – o chamado internet banking. Só em Curitiba, ficou por quase 20 anos, numa rotina urbana. Devido a problemas de saúde do pai, acabou deixando a vida na capital e assumindo a propriedade da família em Apucarana.

    No local, a família destinou 32 hectares para plantio de soja e milho e um galpão onde foram criados frangos de corte até 2016. Para reativar o galpão avícola seria necessário investir cerca de R$ 1,5 milhão. Foi então que Urizzi começou a estudar alternativas para aproveitar o espaço. “Foi aí que vi que a piscicultura intensiva poderia ser viável e uma boa fonte de renda. A partir daí fui me especializar”, conta o produtor.

    Antes de implementar o projeto de piscicultura, Urizzi fez visitas técnicas a uma unidade da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que desenvolve um estudo de cultivo em sistema de bioflocos. Também fez cursos no SENAR-PR e buscou treinamento em São Paulo e Florianópolis. Mesmo com a unidade funcionando, o piscicultor não parava de cavar mais fundo. Em 2022, participou do Programa Empreendedor Rural (PER), do Sistema FAEP/SENAR-PR, no qual desenvolveu um projeto de expansão do negócio, baseado na criação de alevinos na propriedade.

    “O estudo comprovou que o projeto é viável e pretendo implementá-lo. Como o custo não é pequeno, pretendo terminar de quitar os investimentos que fiz recentemente, antes de implantar a fase de creche. Tenho até uma área definida para isso”, diz Urizzi.

    Em pouco tempo, a SJ Fish se tornou referência. Em fevereiro, por exemplo, a Urizzi recebeu alunos da Universidade Estadual de Maringá (UEM) em um dia de campo. Além disso, costuma abrir as portas para outros produtores, levados pelo Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná (IDR-Paraná), interessados ​​em conhecer melhor o sistema de bioflocos.

    A modelo também começa a colher outro tipo de reconhecimento. Em dezembro do ano passado, a Urizzi venceu a categoria minipiscicultura do Prêmio Orgulho da Terra, promovido pelo IDR-Paraná, RIC TV e Sistema Ocepar.

    “Gosto de desafios. E para vencer é preciso especialização e design. Antes de começar, coloquei tudo no papel e fui atrás de conhecimento para evoluir. E a gente nunca pode parar de evoluir”, finaliza.

    Fonte: Agro