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Mesa redonda debate pesquisa e mercado da agricultura no Cerrado

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Dois representantes do setor produtivo agropecuário debateram com pesquisadores da Embrapa Cerrados (DF) problemas, desafios para pesquisa e inovação e perspectivas para a agricultura no Cerrado durante o “Encontro Técnico: Resultados de Projetos e Perspectivas em PD&I na Embrapa Cerrados”, reunião realizada no início de dezembro em Brasília.

O titular da Unidade, Sebastião Pedro, moderou mesa redonda com convidados Joel Ragagnin, presidente da Associação dos Produtores de Soja, Milho e Outros Grãos Agrícolas do Estado de Goiás (Aprosoja Goiás) e membro do Comitê Consultivo Externo (CAE) da Embrapa Cerrados e do Grupo Associado de Agricultura Sustentável (GAAS); e José Guilherme Brenner, presidente da Cooperativa Agropecuária da Região do Distrito Federal (COOPA-DF).

“Nossos convidados representam o setor produtivo, onde acontece a inovação”, disse Sebastião Pedro, acrescentando que os pesquisadores devem vislumbrar brechas de oportunidades com base nas falas de Ragagnin e Brenner sobre as pesquisas da Embrapa. Os convidados falaram sobre suas experiências e visões sobre o setor agrícola e responderam às perguntas dos pesquisadores.

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Joel Ragagnin falou sobre sua trajetória como agrônomo, produtor de grãos, carne e leite em Jataí (GO) e dirigente da Aprosoja Goiás, apontando problemas e oportunidades. “Embora a P&D (na agricultura) seja bastante importante, ainda está muito aquém do que é praticado no dia a dia nas propriedades. Observamos uma grande quantidade de recursos desperdiçados devido à ausência de um estudo mais aprofundado. Isso não é uma crítica, mas uma constatação do que vemos na prática”, afirmou.

Ele destacou que o grande desafio atual é a produção e a produtividade. “O produtor tem fascínio por produtividade, e nós temos trazido o equilíbrio entre isso e a necessidade de ele ser sustentável não só em termos financeiros”, disse, citando o trabalho do GAAS com outras instituições, visando a sustentabilidade de forma mais ampla.

“Acredito que 30% de todos os recursos que utilizamos na agricultura não são validados, principalmente porque, às vezes, não fazem parte do foco de P&D. Mas eles são usados ​​com a crença de que funcionam. Como não temos fatores que determinam os resultados de nossas lavouras, eles precisam ser melhor estudados”, explicou Ragagnin, defendendo que os resultados da pesquisa sejam compartilhados com os produtores. “Mesmo que seja simples e superficial, a pesquisa valida muitas coisas que usamos de forma incorreta”, acrescentou.

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José Guilherme Brenner falou sobre sua experiência pessoal no contexto histórico do desenvolvimento agrícola no Cerrado do Planalto Central, como a introdução da capim-braquiária e sistemas integrados como o Barreirão, recomendações de manejo da fertilidade do solo, as primeiras variedades de soja adaptadas ao região, soluções para cancro do caule (em soja), o Sistema Plantio Direto e a validação de fungicidas para ferrugem asiática da soja. “A Embrapa, ao longo da minha história como produtora, sempre permeou todos os momentos em que surgiram desafios e necessidades, com tecnologias que foram transferidas para o produtor. A agricultura tropical deve muito à Companhia”, disse.

Ele citou o pioneirismo da COOPA-DF na produção de trigo irrigado com a participação da Embrapa, que desenvolveu cultivares como BRS 264 e BRS 254, até hoje as mais plantadas na região, em sistemas que permitem a rotação de culturas e proporcionam sustentabilidade aos pivôs de irrigação. “Sem o trigo, a área irrigada da nossa região perderia muito do ponto de vista de doenças e sem rotação de culturas”, comentou.

O presidente da cooperativa vê o período de estiagem no Cerrado e a entressafra (2ª safra de verão) como uma oportunidade de pesquisa, pois possibilitam uma produção de boa qualidade. “Aqui temos a questão da altitude e a possibilidade de irrigação ou mesmo produzir em sistema de sequeiro, de diversificar (plantações) com girassol, feijão-caupi e leguminosas para consumo humano. Nesse contexto, podemos pensar na sustentabilidade durante a entressafra”, comentou.

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Outra oportunidade apontada por Brenner é a utilização das Áreas de Reserva Legal. “Temos uma grande possibilidade de criar tecnologias que viabilizem o uso sustentável das reservas legais por meio da exploração florestal e de espécies nativas”, afirmou. Ele acrescentou que o avanço biológico da agricultura dará um salto e mudará as perspectivas. “Talvez a perspectiva seja alimentar biologicamente o solo para que possamos produzir as plantas e ter produtividade”, projetou.

Joel Ragagnin comentou que as diferenças entre agricultura familiar e empresarial estão mais relacionadas a ganhos de escala e acesso a recursos do que a princípios. “Nas pequenas propriedades, há um olhar muito mais conservador e técnico nos processos realizados. Os conceitos propagados pelo GAAS têm origem nas pequenas propriedades e nos movimentos biodinâmicos de produção. Na agricultura empresarial, estamos tentando levar isso de uma escala pequena para uma escala macro. Tem sido um desafio muito grande, porque a cada modificação a consequência torna o processo diferente”, disse, exemplificando que a adoção de cultivares transgênicas e o consórcio milho-braquiária, bem como o crescimento exponencial do uso de insumos biológicos, trouxe novos desafios de gestão. “Daí a necessidade de P&D: precisamos de previsibilidade do que vai acontecer”, acrescentou.

Insumos Biológicos e Sistema de Plantio Direto

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Sobre o manejo do solo com uso de bioinsumos e outras tecnologias, Brenner afirmou que falta assertividade técnica e científica quanto à eficácia dos produtos. “Estou plantando com uma determinada bactéria que vai ajudar a solubilizar o fósforo, por exemplo, e estou acreditando. Mas ainda não tenho um ponto de vista técnico efetivo. Na nossa actividade, há muitos ‘vendedores de ilusões’ que batem à nossa porta, oferecendo algo dizendo que nos vai dar mais alguns sacos/ha, mas realmente não sabemos (se funciona). Muitas vezes, vamos nos basear em pesquisas científicas, fazendo uma escolha com base no que ela recomenda. Por isso o método (científico) é importante”, comentou.

Para o presidente da COOPA-DF, as pesquisas atuais devem focar nos insumos biológicos e na ativação biológica do solo, definindo o que pode ser eficaz e quais os rumos que devem ser tomados pelo produtor. “Isso abre uma série de possibilidades na produção agrícola. Estamos em um ambiente tropical, onde as coisas acontecem muito rápido no chão. As potencialidades são imensas”, destacou.

Entusiasta dos estudos em biologia do solo e usuário da tecnologia Soil Bioanalysis (BioAS) para identificar correlações entre ambientes mais e menos produtivos com a qualidade biológica do solo, Ragagnin disse não saber o que realmente causa certas consequências do uso de insumos biológicos. Apesar disso, ele citou como bem-sucedida a experiência com o uso de microrganismos no tratamento de sulcos de plantio para controle de nematóides e fertilizantes organominerais.

“Tudo isso só funciona de forma integrada. A genética sempre foi o guia, e a biotecnologia um acelerador, o que torna o processo mais rápido e seguro. Mas a genética não pode ser sustentada sem manejo. Acredito que um grande seguro para a agricultura está relacionado ao ambiente certo, manejo equilibrado e genética de qualidade. E a biologia pode ‘amortecer’ a maior parte dos problemas em ambientes de maior risco à produção”, analisou o presidente da Aprosoja Goiás.

José Guilherme Brenner destacou a importância do Sistema de Plantio Direto (SPD) para os sistemas de produção agrícola do Cerrado. “Acredito que o SPD traz uma grande possibilidade porque temos a rotação de culturas e a implantação de novas culturas. Em nossa região, começamos a expandir a produção de segunda safra, que entra em um sistema que pode ter sorgo, milho, girassol, uma gama de culturas que vai dar diversificação”, disse. Por outro lado, apontou como gargalo a preponderância de questões operacionais sobre o refinamento do sistema, além da alta prevalência da soja como primeira safra, sem muitas alternativas economicamente viáveis.

“Independente do tipo de solo, o SPD só funciona bem se houver incorporação de matéria orgânica pelas raízes, para permitir que a água penetre e fique retida no solo, e tenha uma boa palha. Outras formas acabarão por ter alguma restrição na produtividade”, completou Joel Ragagnin, acrescentando que, segundo suas próprias experiências, às vezes são necessárias intervenções mecânicas, mas, na maioria das vezes, não dão resultado. O plantio em curvas de nível tem mostrado bons resultados na prevenção da erosão do solo e laminar.

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Demandas de pesquisa e tecnologia

O presidente da COOPA-DF comentou que os experimentos dos produtores são limitados por questões de método, que não é científico, e pelo alto risco de se fazer um experimento cujos resultados eles desconhecem. “Por isso, é importante que a Embrapa se articule com cooperativas que tenham um corpo técnico capacitado para a experimentação prática de longo prazo. Essas cooperativas são excelentes difusoras de tecnologia”, afirmou.

O presidente da Aprosoja Goiás defendeu o estímulo à diversidade e diversificação em termos de colaboração para experimentação em pequenas propriedades. “Quando esses ambientes são estimulados a se diversificar, gera-se um potencializador de observação. Você ‘obriga’ as pessoas a observar cada vez mais as mudanças nos processos que fazem, seja no uso de insumos, nas lavouras que plantam ou no uso de novas tecnologias. Funciona muito bem quando você volta àquele ambiente e encoraja a pessoa a falar e compartilhar sua experiência. É o grande ponto de arrecadação de resultados”, comentou, acrescentando que os custos da medida, considerando a possibilidade de retorno e os riscos, representam um investimento.

Quanto à demanda por tecnologias pelos cooperados, Brenner destacou que a cooperativa proporciona igualdade de oportunidades, sendo o cooperativismo fundamental no país e no mundo. “Quando a cooperativa faz uma compra de insumos ou produção agrícola, ela compra com o mesmo risco para todos. A organização cooperativa é uma forma de fazer o pequeno produtor participar da grande escala. É uma forma de dar escala para quem não tem escala”, explica,
Ele discorda que haja uma dicotomia entre agricultores familiares e empresários. “As coisas estão muito mais dinâmicas e interativas. As zonas são muito mais cinza do que preto e branco, não devemos fazer tanta segregação nisso. Todos precisam da tecnologia, que é o que faz todos os produtores progredirem”, opinou.

Para Ragagnin, a distinção entre agricultores empresariais e familiares está relacionada ao alinhamento das políticas públicas. “Embora façamos a mesma coisa, às vezes as necessidades são diferentes em termos de escala, tempo, diversidade de produção. Mas quem planta soja é complementar a quem planta alface”, explica. “E o ambiente cooperativo talvez seja o mais importante em toda a estrutura produtiva. Uma tecnologia utilizada em grandes propriedades, pela combinação de processos e capilaridade da cooperativa ou associação, torna-se viável também em pequenas propriedades”, complementa.

Ao final da mesa-redonda, Brenner e Ragagnin destacaram o papel fundamental dos pesquisadores da Embrapa. “É difícil imaginar quais serão os resultados da pesquisa, o que será aplicado e o que não será. A Embrapa tem uma importante parceria conosco. Nossa agricultura é motivo de orgulho para o nosso país e a questão da alimentação no mundo passa pelo Brasil e por vocês, que são a peça mais importante nessa equação”, disse o presidente da COOPA-DF. “Elevamos a importância de vocês, pesquisadores e desenvolvedores de tecnologia, que é sempre fundamental”, agradeceu o presidente da Aprosoja Goiás.



Fonte: Agro

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