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O papo de Lula sobre a autonomia do BC é assustador, mas o mercado e o Tesouro não enxergam…

tag:reutersPor André Romani e Bernardo Caram

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BRASÍLIA/SÃO PAULO (Reuters) – As críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à autonomia do Banco Central (BC) geraram uma reação negativa nos ativos financeiros locais, mas agentes do mercado disseram não ver risco de mudanças efetivas no modelo, ao menos para bem, mesmo que as declarações gerem preocupação.

Uma fonte do Ministério das Finanças disse à Reuters que não há nada prático em estudo nesta área na carteira. Da ala política da Esplanada, o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, negou publicamente a intenção do governo de mudar a relação com o BC.

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Lula afirmou, no início da noite desta quarta-feira, que o BC independente não faz mais agora do que quando o presidente da instituição era trocado sempre que um novo governo tomava posse. O comunicado ajudou a pressionar o dólar e os juros futuros no pregão desta quinta-feira, principalmente durante a manhã, e também foi citado por analistas da bolsa, já que a autonomia é vista como um inibidor de ingerência política no Banco Central.

“Minha discordância é que neste país eles lutaram para ter um Banco Central independente pensando que melhoraria o quê?” disse Lula, em entrevista à GloboNews. “É bobagem pensar que vai fazer mais do que o presidente indicou”, continuou, acrescentando que, mesmo com o Banco Central independente, os juros e a inflação continuam altos.

Thaís Zara, economista sênior da LCA Consultores, disse à Reuters que teve a impressão de que os discursos “têm mais um pano de fundo político e menos algo que realmente será buscado”, “apesar de trazer mais turbulência aos mercados”. Ela acrescentou que o discurso de Lula seria mais voltado para os apoiadores.

Zara também citou declarações recentes da equipe econômica do governo em que indicaram que o foco no primeiro semestre seria aprovar as diretrizes da reforma tributária e um novo arcabouço fiscal. “Algo como a reversão da independência do BC não caberia nessa pauta”, disse ela.

Após a reação negativa, Padilha afirmou no Twitter que não há “nenhuma predisposição” do governo para fazer qualquer mudança na relação com o BC, o que ajudou na melhora dos ativos locais à tarde. O dólar fechou ligeiramente em alta frente ao real e o Ibovespa avançou.

Em palestra nos Estados Unidos, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, minimizou as críticas de Lula, mas reforçou a defesa da autonomia do órgão e prometeu permanecer no cargo até o fim do mandato.

A independência, ou autonomia, do BC foi estabelecida por lei sancionada em 2021 pelo ex-presidente Jair Bolsonaro após aprovação do Congresso.

O texto estipula, entre outros pontos, que os mandatos do presidente e dos diretores da autarquia não coincidem com o do presidente da República. Ou seja, mesmo que o presidente do país continue com o poder de indicar esses cargos, ele terá que conviver com autoridades indicadas por seu antecessor por um tempo.

PÉ ATRÁS

Outro ponto levantado foi a disposição do Congresso em aprovar mudanças nessa pauta.

Adauto Lima, economista-chefe da gestora Western Asset, disse que não vê parlamentares aprovando a reversão da autonomia do BC agora por conta de outras prioridades da agenda. Mas ele considera que a postura dos parlamentares pode mudar, principalmente em caso de piora da economia. “Estou sempre com o pé atrás.”

O gerente da mesa de câmbio da Commcor, Cleber Alessie, disse que o assunto ainda parece ser “mais barulhento”, mas destacou o caráter “delicado” do assunto.

Nesse contexto, ganha corpo no mercado o debate sobre um possível desalinhamento entre a chamada ala política do governo e a área econômica. Essa desconfiança cresceu nesta semana, com declarações do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, sendo lidas como mais alinhadas a temas caros aos investidores, como reforma tributária e agenda fiscal, contrariando o tom adotado por Lula.

“Afinal, o que é o governo de fato?”, escreveram analistas da corretora Mirae Asset nesta quinta-feira, em relatório, contrastando falas recentes das duas autoridades.

META DE INFLAÇÃO

Além da autonomia do BC, a declaração de Lula questionando a atual meta de inflação e sugerindo um teto maior também estressou o mercado.

“Olha, você define uma meta de inflação de 3,7%, quando você faz isso, você tem que apertar ainda mais a economia para chegar a 3,7%. Por que você precisa fazer 3,7%? Por que não fazer 4″ ,5% como fizemos?”, disse Lula.

A meta anual de inflação –medida pelo IPCA– é definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), e inclui uma margem de tolerância. O sistema foi criado em 1999.

Para Zara, da LCA, a questão da meta de inflação é ainda mais preocupante, porque “ela impacta nas expectativas de inflação” e, para ela, seria relativamente mais fácil de mudar.

A mais recente pesquisa Focus semanal do Banco Central mostra que a expectativa dos economistas de mercado para o IPCA em 2025 já está em 3,5%, acima do centro da meta de 3% para o ano. A Zara afirma que, se a meta for elevada pelo CMN, essas projeções também serão, o que impacta, por exemplo, a curva de juros.

Este ano, o CMN define a meta para 2026 e tem que confirmar ou não as já estipuladas. A formação do colegiado já passou por mudanças e atualmente conta com Campos Neto, Haddad e a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet. A fonte da equipe econômica afirma ainda que não há estudo para elevar as metas.

“Lula tem legitimidade para querer mudar (a meta), mas agora como ele iria convencer os deputados a votarem pelo aumento, seria uma questão a ver”, disse Adauto, da Western, acrescentando que não viu Tebet ou Campos Neto votando a favor.



Fonte: Noticias Agricolas

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