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Dias de Campo em Ipameri (GO) mostram a eficiência de sistemas integrados e…

“É possível produzir mais, ganhar mais dinheiro e produzir de forma mais sustentável” – assim resumiram os pesquisadores Robélio Marchão e Roberto Guimarães a experiência da Fazenda Santa Brígida, referência em intensificação sustentável. O 14º Dia de Campo da Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF) em Ipameri (GO) reuniu cerca de mil pessoas, com a retomada do evento presencial após a pandemia. Com foco na produção sustentável e no mercado de carbono, foram apresentados dados que comprovam a eficiência do sistema.

William Marchió, consultor agrícola, mostrou aos participantes o lucro por hectare obtido na propriedade: soja – R$ 5,2 mil; soja e gado safrinha – R$ 9,38 mil; pecuária intensiva – R$ 9,4 mil – o equivalente a 54 arrobas por hectare, um resultado inédito, garante o consultor.

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Durante sua apresentação, o próprio palestrante questionou a plateia: “Se a soja e o gado de entressafra dão o mesmo retorno econômico da pecuária intensiva, por que investir na segunda opção?”. A resposta sai do óbvio: “A razão é mais nobre que isso”. Ele explica que o boi cicla nutrientes e aumenta a quantidade de bactérias benéficas presentes no solo, e o pastoreio estimula a produção de raízes. “O Zuri produz muita raiz, de 15 a 20 toneladas de matéria orgânica por hectare de solo”, exemplifica. Ele acrescenta: “Essa ciclagem é extremamente importante porque vamos sequestrar CO2. Mesmo que eu não esteja ganhando nada por isso, nós o sequestramos. Algum dia talvez?”.

Esse dia pode estar muito próximo. A Associação Rede ILPF está trabalhando para tornar o sistema integrado parte do mercado de carbono. Em 2022, o mercado regulado movimentou US$ 865 bilhões em todo o mundo, com tendência de crescimento ascendente. Nesse cenário, a América Latina é a região com melhores condições para participar desse mercado, com destaque para o potencial brasileiro, garantem os especialistas (ver matéria).

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Para fortalecer a participação do Brasil, a Embrapa tem apostado na intensificação sustentável para aumentar a eficiência dos sistemas de produção. A partir dela, surgiram conceitos como carne carbono neutra e soja com baixo teor de carbono, que dão selo a produtos que não emitem carbono em toda a sua cadeia, com maior valorização no mercado, principalmente internacional.

Essa mesma proposta pode ser estendida a outros produtos, reforça o pesquisador da Embrapa Cerrados Robélio Marchão: “A Embrapa tem trabalhado em metodologias e protocolos de boas práticas adotados pela propriedade para certificar commodities. Para a soja, por exemplo, vamos ter um selo para garantir que ela seja produzida de forma mais sustentável”.

“E por que estamos preocupados com o carbono?” ele pergunta. Apesar de ser uma preocupação mundial, o pesquisador destaca que o Brasil é o quinto maior emissor de gases de efeito estufa e que cerca de 28% dessa emissão está ligada à atividade agrícola. “Embora isso seja um problema, também pode ser uma grande oportunidade para o setor”, garante. Os pesquisadores Roberto Guimarães Júnior e Robélio Marchão também apresentaram dados de produtividade animal em diferentes situações: em pastagens de baixa produtividade – 350 gramas/animal/dia; pastagem intermediária – 450 gramas/animal/dia; Sistema de Integração Lavoura-Pecuária – 600 gramas/animal/dia.

Com esses dados, é possível afirmar que os sistemas integrados contribuem para mitigar o impacto ambiental do setor agropecuário ao reduzir a idade de abate dos animais. “Aumentando a eficiência do sistema melhorando as condições do pasto, o que faz com que o animal tenha uma alimentação de melhor qualidade, reduzimos a idade em que esse animal pode ser abatido, que passará menos tempo no sistema. Na primeira condição, o abate levaria 44 meses. Na integração, com resultado conservador, o abate ocorre aos 28 meses”, explicam.

Na atividade agrícola, os ganhos se refletem na produtividade. “A análise dos trabalhos realizados na fazenda e nas áreas experimentais, durante 16 ciclos de cultivo, revelou que nas áreas com gramíneas forrageiras como cobertura, a produtividade média foi de onze sacas a mais de soja, o que equivale a R$ 1.600 a mais por hectare simplesmente por causa da rotação com pastagens”, garante.

O caso da Fazenda Santa Brígida

Em 2006, Marize Porto procurou a Embrapa em busca de soluções para as áreas de pastagens degradadas de sua fazenda e ouviu de especialistas que com a agricultura ela possibilitaria a renovação de suas pastagens, conforme explica o consultor da fazenda, Roberto Freitas, que apresentou ao participantes a trajetória de intensificação sustentável da fazenda, desde a predominância de pastagens degradadas até o sistema ILPF.

E Marchió estava certo ao afirmar que há outras razões para a adoção de sistemas integrados, além do retorno econômico. Pesquisadores da Embrapa Cerrados atestam melhora nos índices relacionados à saúde do solo na fazenda Santa Brígida após a adoção de boas práticas, o que mostra a evolução do sistema. “Aqui na Fazenda Santa Brígida, consigo ver o que está acontecendo a partir de uma análise de solo convencional. O estado da quinta, quando Marize Porto [proprietária da fazenda] começou esse trabalho, eram pastagens com baixa produtividade, bastante antigas. Depois de seis anos usando os sistemas integrados e outras tecnologias da Embrapa, ela já conseguiu agregar matéria orgânica ao solo, com o índice passando de 1,8 para 3,2”, explica o pesquisador Robélio Marchão.

Para entender melhor o sistema, Marchió apresentou informações sobre a gestão adotada na propriedade. Foram várias as perguntas dos participantes: “Como é feito o rodízio na fazenda Santa Brígida?” Quanto tempo o gado fica no campo?”. Em cada resposta, o consultor deu detalhes específicos do trabalho realizado. “Plantamos o milho com o [capim] Zuri. Depois colhemos o milho e fica o pasto. A partir daí, fazemos a rotação. Esta é a maneira mais barata de fazer isso. Durante três anos, o gado pasta no campo. Depois da estiagem, a pastagem é dessecada e a lavoura é instalada com plantio direto”.

Marchió conclui: “Hoje, aqui em Santa Brígida, não conseguimos mais dissociar o gado da agricultura. A pecuária faz parte da solução ambiental. Com o boi, conseguimos neutralizar a produção, conseguimos ser carbono neutro quando intensificamos a produção. O boi é parte da solução e não um problema para o nosso país”. A participante Maria Inês da Cunha, que trabalha no setor de insumos agrícolas, concorda: “Só assim o gado sobrevive. A colheita vai dar nova vida ao gado”.

Uso de bioinsumos como ferramenta de intensificação

Outra tecnologia discutida durante o Dia de Campo foi o uso de bioinsumos que permitem captar o nitrogênio do ar e fixá-lo no solo. O pesquisador da Embrapa Soja, Marco Antônio Nogueira, abordou a importância das bactérias para sistemas integrados: “A inoculação de gramíneas, no caso do milho e do trigo, aumentou a produtividade em 24% em sistemas com baixo nível tecnológico. Nas áreas de maior nível tecnológico, o ganho médio de produtividade é superior a 5%, com ganhos no teor de folhas acima de 4% e no teor de nitrogênio nos grãos de 3,6%”.

A inoculação será uma estratégia adotada em Santa Brígida em 2024. “Vamos usar o Azospirilum. Três aplicações custam 10% do valor da ureia e entregam 40 quilos de nitrogênio”. O consultor William Marchió diz que o produto substituirá a ureia. O inoculante trará ganhos em nitrogênio, com redução nos custos de produção, e também com a vantagem de ser um produto natural em substituição a um químico.

Outro aspecto da tecnologia que poucos prestam atenção é o número de raízes, reforça Nogueira. O uso de inoculantes possibilita um aumento médio na produção de raízes em torno de 12%. Em 2022, foram vendidas mais de 10 milhões de doses do inoculante com Azospirillum, bactéria que está sendo utilizada em produtos próprios para gramíneas.

O pesquisador conta que no ano passado, devido aos preços e à dificuldade de acesso aos fertilizantes nitrogenados, o levantamento recomendou a redução de 25% na adubação nitrogenada para cobertura e uso de inoculação. Os resultados mostraram que esse ajuste não causa perda de produtividade. “Isso se deve ao grande aumento da área de raízes que esses microrganismos promovem, que têm mais condições de explorar o solo em busca de água e nutrientes, inclusive nutrientes altamente móveis, como o nitrogênio”, explica.

Com a redução da adubação, a economia para o produtor foi de R$ 260 por hectare. “Outro aspecto muito importante que precisamos enfatizar cada vez mais: deixou de emitir mais de 200 quilos por hectare de CO² equivalente. É algo que teremos que pesar contra os benefícios de nossos sistemas de produção”.



Fonte: Noticias Agricolas

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