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Mudanças no biodiesel brasileiro podem restringir sebo e palma e…

por Rafaella Barros

(Reuters) – Algumas das mudanças nas especificações do biodiesel utilizado no Brasil em debate na Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) indicam restrição na demanda por determinadas matérias-primas, como gordura animal e óleo de palma, À medida que as discussões sobre a qualidade do produto amadurecem, disseram membros do setor.

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A redução do uso de sebo bovino – terceira matéria-prima mais utilizada na produção de biodiesel no Brasil – ou de óleo de palma seria uma alternativa para reduzir problemas na qualidade do biocombustível. Isso pode afetar empresas como JBS, Minerva e BBF. Por outro lado, beneficiaria os “jogadores” que trabalham com óleo de soja, com potencial para aumentar a dominância desse insumo.

A agência reguladora, que avalia a situação desde julho de 2020, disse que não pretende excluir nenhuma matéria-prima do processo em uma definição que deve demorar entre dois e três meses. A resolução visa melhorar a qualidade do biodiesel e solucionar problemas identificados pelo mercado automotivo e distribuidores de combustíveis.

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Entre esses problemas estão, por exemplo, oxidação e degradação do biodiesel, decantação do material no fundo dos tanques, entupimento de filtros e congelamento durante o inverno, principalmente no sul do país.

Entre as exigências discutidas na ANP que podem afetar a demanda por gordura animal e óleo de palma estão a redução do limite máximo de monoglicerídeos, que passaria dos atuais 0,7% em massa para 0,4% em massa, e o chamado Teste de Filtração por Imersão a Frio (TFIF), o que seria uma barreira para essas matérias-primas, segundo duas fontes do setor produtivo.

“Isso levará à necessidade de mudar o mix de matérias-primas. Seria necessário reduzir principalmente a participação da gordura animal, que é uma grande preocupação das empresas. Imagine uma empresa que vem de uma geladeira. Terá que comprar mais óleo vegetal, matéria-prima fora de sua cadeia produtiva”, disse uma fonte do setor produtivo, sob condição de anonimato.

“Isso está prejudicando o sebo e a palma. Você não poderá fazer biodiesel com uma determinada porcentagem maior que 20% a 30%. Significa limitar os produtores”, disse uma segunda fonte.

A ANP não indicou nenhum percentual para o uso de matéria-prima de biodiesel. A agência afirmou que avalia as cerca de 200 sugestões que recebeu na consulta pública e que, pela complexidade do tema, estão em “detenção de estudos e debates para decidir se vão acatá-las ou não”.

“Não há seleção ou adoção de matérias-primas preferenciais para a produção de biodiesel, e o produtor pode usar qualquer uma que julgar conveniente”, disse a ANP à Reuters.

“O obrigatório é que o produto final cumpra as especificações padronizadas”, disse o regulador, na nota, acrescentando que a eventual adoção de limites ou parâmetros apontados pelos produtores “não inviabiliza a utilização das referidas matérias-primas” .

Por outro lado, o coordenador do Mercado Interno da Associação Brasileira de Reciclagem Animal (ABRA), Lucas Portela, critica o andamento das discussões por avaliar que não há garantia de que trarão maior eficiência ou qualidade.

“Observamos que não há um estudo mais aprofundado dessas mudanças, um grupo de pesquisa mais amplo. Lógico. Há todos os pareceres técnicos da ANP, mas achamos que há necessidade de mais pesquisas científicas”, disse Portela.

Ele admitiu que uma eventual mudança obrigaria o setor a aumentar a parcela destinada à produção de sabão e também as exportações de sebo.

Procuradas, as grandes empresas do setor que trabalham com sebo bovino como matéria-prima, JBS e Minerva, não comentaram o assunto. O mesmo aconteceu com a BBF, que trabalha com óleo de palma.

VIABILIDADE

As alterações avaliadas visam evitar problemas de congelamento e, consequentemente, entupimento de filtros e injetores nos motores dos veículos.

Segundo a pesquisadora da Embrapa Agroenergia, Itânia Soares, as saturações do biodiesel à base de soja, por exemplo, e do produzido a partir de gordura animal são diferentes, o que justifica a análise do setor quanto à impossibilidade de atender a essas especificações.

“Essa característica confere maior fluidez ao biodiesel à base de soja. A gordura animal é a mais problemática porque tem mais cadeias de saturação [o que deixa o produto menos fluido]. Por exemplo: se você faz biodiesel apenas de soja, é ‘bonito’ a 20 °C. Se fizer com sebo animal, principalmente carne bovina, vai solidificar em pouco tempo”, disse Soares, acrescentando que o mesmo ocorre em relação ao dendê.

Para Soares, as avaliações da ANP são válidas, mas a qualidade do biodiesel brasileiro atual não perde para o biodiesel do Canadá, Estados Unidos e países europeus.

“Nossas especificações já são muito rígidas. Acreditamos que existem muitos problemas com boas práticas. Se você não tiver cuidado no transporte, mesmo depois de misturá-lo ao diesel, com certeza terá problemas de contaminação”, disse.

Segundo dados da ANP, a gordura bovina é a terceira matéria-prima mais utilizada na produção de biodiesel no Brasil este ano, respondendo por 7,9% do total, atrás do óleo de soja (66%) e matérias gordurosas (16,6%), que mistura matérias-primas matérias-primas provenientes do reprocessamento de subprodutos da produção, incluindo gorduras animais.

Em quarto lugar (7,2%), vem o grupo que inclui as gorduras de frango e suína e os óleos de algodão, canola, milho e fritura (usados). Por fim, estão os óleos de palma e dendê, com 2,3% juntos.



Fonte: Noticias Agricolas

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