Quando a primeira indústria 100% dedicada à produção de etanol de milho começou a operar no Brasil, em 2017, o rendimento industrial médio era de 357 litros de etanol por tonelada de milho processado. Seis safras depois, na safra 2023/2024, a produtividade estimada é de 444 litros/ton, um ganho de produtividade de 24,3%. Desde então, a produção anual de biocombustível a partir do milho passou de 500 milhões de litros para 6 bilhões, conforme expectativa para a safra 2023/2024.
A evolução da produção e eficiência produtiva, resultante da incorporação de tecnologias de ponta com melhorias significativas nos fluxos do processo, combinada com o uso de enzimas e leveduras avançadas responsáveis pela fermentação e originação do etanol de milho e seus produtos agregados , fez surgir verdadeiras biorrefinarias que transformam o excedente da produção de milho de segunda safra em bioenergia, óleo e produtos para nutrição animal. Atualmente, existem 18 (dezoito) indústrias operando no Centro-Oeste brasileiro, 01 (uma) indústria cooperativa no Nordeste e outras 2 (duas) nas regiões Sul e Sudeste.
Ao mesmo tempo, o setor começa a se movimentar em diversas direções no país, do Sul e Sudeste ao Norte e Nordeste, com muita adesão, principalmente a região do Matopiba (Maranhão; Tocantins; Piauí e Bahia) com grande vocação e pouca demanda interna por milho, além da deficiente estrutura de armazenagem e logística.
As indústrias nacionais e de capital estrangeiro viram no Brasil a combinação perfeita entre farta oferta de matérias-primas, potencial para aumentar a produção e mão de obra qualificada, com um mercado regulado por mandato para misturar etanol à gasolina, uma rede de distribuição consolidada e o motor flex tecnologia implementada em mais de 80% da frota de viaturas ligeiras que circula de norte a sul do país.
O mercado consumidor, importante elo de todo o setor econômico, ganhou força nas últimas semanas após o anúncio de cortes de impostos para estimular a indústria automobilística e facilitar o acesso da população a veículos com preços até R$ 120 mil.
Comemoramos um avanço de curto prazo, mas ainda é preciso que o país defina claramente sua política de mobilidade e transição energética, alavancando incentivos e investimentos sustentados nos pilares ambiental, social e econômico, para não correr o risco de fomentar matrizes energéticas não voltadas para a realidade brasileira. Isso poderia desindustrializar toda uma cadeia de negócios consolidada que gera empregos, renda e impostos, ativa uma rica economia circular ao transformar grandes excedentes exportáveis de grãos em bioenergia e contribui para mitigar o déficit logístico e de armazenamento de grãos em todo o país.
A nova política tributária será aplicada de acordo com alguns critérios pré-estabelecidos pelo governo. Os veículos com preço mais baixo, menos poluentes e com mais itens nacionais serão os mais beneficiados. Essa categorização visa ampliar o acesso da população de menor poder aquisitivo a veículos de matriz energética mais sustentável e fabricados no Brasil.
Com isso, o governo atende a pelo menos duas demandas internas extremamente importantes. Sendo econômico, com foco no estímulo à produção industrial e ao consumo de produtos nacionais. E uma segunda focada na sustentabilidade socioambiental, pois prioriza veículos que utilizam biocombustíveis renováveis produzidos no país.
Atingir as metas de neutralização das emissões de gases de efeito estufa passa necessariamente pela redução do uso de combustíveis fósseis, altamente poluentes e esgotáveis.
O etanol de milho, quando comparado à gasolina no ciclo conhecido como “do poço à roda”, ou seja, extração, produção e queima, registra uma redução de 80% nas emissões de dióxido de carbono (CO2). Esse desempenho é proporcionado por alguns fatores que compõem o processo produtivo do etanol de milho brasileiro. Em primeiro lugar, podemos citar o aproveitamento dos grãos produzidos na segunda safra, ou seja, que não dependem da abertura de novas áreas e não competem com a produção de alimentos.
Além disso, boa parte do dióxido de carbono é sequestrado/absorvido na fase de crescimento da cultura, contribuindo assim para a neutralização das emissões. O fato é que o programa Renovabio, principal política de descarbonização do país, utiliza os créditos de descarbonização gerados pelas indústrias de etanol para compensar as emissões de combustíveis fósseis.
Outro ponto muito importante e um dos principais diferenciais da indústria brasileira de etanol de milho é a utilização de uma fonte de energia renovável, baseada na utilização da biomassa de florestas plantadas como fonte de calor e geração de energia para a produção de biocombustível, co- gerando excedentes para o sistema elétrico nacional.
Ou seja, ao incentivar a produção e o consumo de carros nacionais movidos a etanol, o governo está movimentando toda uma cadeia circular de negócios que vai desde o produtor rural de milho e eucalipto, até as indústrias de etanol, além de toda a indústria automobilística fornecedora indústria, incluindo concessionárias de automóveis e biocombustíveis. Sem falar no consumidor final, que poderá comprar carros de qualidade e com preços mais acessíveis.
Não paramos por aqui, existem muitos projetos de investimento no setor de etanol em fase de prospecção e captação de recursos. A indústria de biocombustíveis limpos carece de uma política econômica definitiva, com regras claras no âmbito fiscal, juros baixos atrativos e segurança jurídica.
A retomada do projeto “Combustível do Futuro” do Ministério de Minas e Energia (MEE) e do Programa Rota 2030 do Ministério da Indústria, Comércio e Serviços (MDICS) são boas iniciativas que podem consolidar políticas públicas na agenda brasileira de descarbonização e transição energética, não deixando de incorporar na avaliação a vocação dos biocombustíveis e os benefícios do desenvolvimento social e econômico de todas as cadeias empresariais envolvidas, juntamente com os requisitos de eficiência energética e descarbonização.
*Guilherme Linares Nolasco é veterinário e CEO da Unem – União Nacional do Álcool de Milho