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Paraná alavanca produção orgânica

    45 anos de desenvolvimento do estado por meio da agricultura

    Quando os produtores rurais Vanessa e Fábio Xavier da Silva resolveram “girar o interruptor”, houve quem os chamasse de “loucos”. Na época, o casal dedicou a propriedade de sete hectares na Lapa, na Região Metropolitana de Curitiba (RMC), à agricultura convencional, com cultivo de soja, milho e feijão, além de pastagens. A certa altura, optaram por dedicar parte da área à produção de alimentos orgânicos, o que causou estranheza entre vizinhos e familiares.

    O estopim para essa mudança, segundo eles, foi um curso do SENAR-PR realizado em 2013, que não tinha ligação direta com a gestão orgânica. “Eu fiz o PER [Programa Empreendedor Rural] e o projeto era na área de milho [convencional]. Na aula, conheci pessoas que já trabalhavam com produtos orgânicos e acabaram me apresentando as possibilidades dessa área”, conta Vanessa. Nesse mesmo ano, o casal passou a dedicar um hectare à produção de feijão e hortaliças sob manejo orgânico. O que começou como um experimento acabou dando certo.

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    Após fazer o curso de “Agricultura Orgânica Básica” no SENAR-PR e buscar outras fontes de conhecimento, o casal foi aumentando gradativamente o espaço dedicado aos produtos orgânicos até atingir toda a área. Dessa forma, em 2015, obtiveram a primeira certificação de produtores orgânicos do Instituto Tecnológico do Paraná (Tecpar). Para isso, tiveram que investir em barreiras verdes, que impedem o escoamento de defensivos das propriedades vizinhas, e na proteção da água utilizada na produção.

    Semanalmente, a propriedade de Fábio e Vanessa produz uma tonelada de alface, a mesma quantidade de alho-poró, 800 unidades de brócolis, 300 unidades de repolho, 100 quilos de beterraba, além de 9 mil bandejas de milho verde a cada safra, sem contar couve, espinafre , yacon e acelga.

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    Embora seja possível usar uma série de produtos para controle de insetos no manejo orgânico, o casal optou por não aplicá-los, deixando apenas os inimigos naturais para lidar com as pragas. Tanto que, segundo Fábio, a acelga é plantada “para os bichos”, referindo-se às pragas que preferem comer a folha em detrimento de outras hortaliças. “O rejunte funciona, mas seria mais adequado para uma propriedade menor. Em sete hectares não conseguimos aplicar”, explica o produtor, que, além da esposa, conta com a ajuda de três funcionários que trabalham até quatro vezes por semana.

    O casal da Lapa não é um exemplo isolado. Segundo dados do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), o Paraná possui 3.825 produtores de alimentos orgânicos certificados, o que coloca o Estado como um dos maiores produtores desse tipo de alimento no país. “Os certificados geralmente são válidos por um ano, depois é preciso renovar. Isso faz com que esse número oscile mês a mês, mas, no geral, Paraná e Rio Grande do Sul lideram o ranking brasileiro”, observa o coordenador estadual do Programa de Agroecologia do Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná (IDR-PR), André Luís Miguel Alves. Em 1º de março, quando a lista do Mapa foi atualizada, havia 3.856 produtores orgânicos certificados no Rio Grande do Sul (apenas 31 a mais que no Paraná). No início do ano, os paranaenses lideravam o ranking nacional.

    Embora não haja dados oficiais sobre o volume produzido sob manejo orgânico, estimativas do governo do Paraná apontam para uma produção anual de 50 mil toneladas, que inclui frutas, hortaliças, grãos e mandioca. “A Região Metropolitana de Curitiba tem como foco as hortaliças. E, nos últimos anos, começaram a surgir diversos polos no estado que rapidamente se consolidaram na produção de produtos orgânicos. No Norte Pioneiro, por exemplo, estimamos que existam 400 produtores orgânicos certificados, que produzem principalmente tomates para enviar para São Paulo e Rio de Janeiro. Na região central cresce muito o [produção de] erva-mate orgânica certificada. No Sudoeste, temos duas empresas trabalhando com grãos orgânicos e, no Noroeste, há outra empresa promovendo a mandioca orgânica”, relata Miguel.

    Essa expansão conta com produtores que iniciaram sua atividade no sistema orgânico (leia mais abaixo) e outros que migraram do manejo convencional para o orgânico. É o caso também da produtora Luciane Hayduki Kmiecik, de Campo Largo, na RMC, que por 11 anos dedicou a propriedade da família à produção convencional de grãos e hoje produz uma infinidade de verduras, batatas, frutas, temperos e ervas medicinais , tudo no sistema orgânico. . “Começou quando nossos filhos começaram a andar. Como as crianças sempre brincavam na propriedade, decidimos mudar a gestão para eliminar os agrotóxicos do nosso sistema”, lembra Luciane.

    A exemplo da Lapa, a troca de experiências foi fundamental para Luciane ampliar seus conhecimentos e viabilizar a produção. “Eu tinha familiares que já conheciam o [manejo] orgânico e indicou o curso SENAR-PR. Foi aí que comecei a entender como essas coisas funcionam, e o mais interessante: na prática! Fiz cursos de horticultura orgânica, manejo de pragas, morango, boas práticas e outros no SENAR-PR”, lembra.

    Mesmo cursos não voltados ao manejo orgânico são valiosas fontes de conhecimento para os produtores, independentemente do sistema de produção adotado, garante o produtor Carlos Eduardo Iwasaki, de Balsa Nova (RMC). “Os cursos do Programa HortiMais, do SENAR-PR, fiz praticamente todos e garanto que são bons, muito técnicos e práticos. Esses cursos ajudaram a colocar a produção no sistema orgânico. Mesmo não sendo um treinamento específico para orgânicos, os instrutores têm muita experiência”, avalia.

    Hoje, a Iwasaki produz produtos orgânicos em uma área de 1,8 hectares, tendo como principais produtos a uva de mesa, o caqui fuyu e o tomate. “Também tem algumas ervilhas e outros produtos em pequenas quantidades”, explica. No início, a propriedade era convencional, mas quando ele assumiu, há cinco anos, começou a transição para a gestão orgânica. Após os ajustes necessários e a pandemia do coronavírus, a certificação veio em 2021.

    Na visão do produtor de Balsa Nova, ainda há resistência dos agricultores tradicionais ao manejo orgânico. “Quem trabalha há muito tempo no convencional tem resistência à mudança. As pessoas se acostumaram a depender do produto, não do manejo”, observa, referindo-se aos agrotóxicos.

    Mas, segundo Vanessa Reinhart, do Departamento Técnico (Detec) do Sistema FAEP SENAR-PR, é possível observar uma tendência da agricultura convencional buscar cada vez mais ferramentas no modo de produção orgânico. “Os produtores da agricultura convencional estão absorvendo técnicas preconizadas na agroecologia, como o uso de culturas de cobertura, plantio direto, diversificação, integração entre culturas, consorciação, uso de bioinsumos, entre outras”, enumera. “[Os produtores de alimentos orgânicos] são pioneiros na adoção de algumas tecnologias que depois são disseminadas para a agricultura como um todo, como produtos biológicos e adubação verde”, acrescenta o coordenador do IDR-PR.



    Fonte: Agro