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Estudo possibilita criação de levedura modificada especificamente para…

Pesquisas brasileiras abrem caminho para aumentar a eficiência na produção de etanol de segunda geração (2G) com a descoberta de novos alvos de engenharia metabólica para uma linhagem de levedura industrial mais robusta. Um artigo com o resultado do trabalho foi publicado recentemente na revista Relatórios Científicos.

Todas as bases de dados do trabalho estão à disposição da comunidade científica no repositório da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que faz parte da iniciativa internacional Dataverse, apoiada pela FAPESP.

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O etanol de primeira geração (1G) é produzido a partir de fontes ricas em carboidratos (como a sacarose), principalmente a cana-de-açúcar, no caso do Brasil. O processamento da cana-de-açúcar gera grande quantidade de resíduos fibrosos, como o bagaço, que pode ser utilizado para geração de vapor e energia elétrica nas usinas. Mas esse resíduo é rico em celulose e hemicelulose, tipos de carboidratos poliméricos encontrados em plantas e árvores, que lhes conferem rigidez. Assim, eles também podem ser usados ​​para produzir mais etanol, chamado 2G, pois podem ser convertidos em moléculas menores para serem fermentados por leveduras e outros microorganismos.

No entanto, o maior desafio para a produção de etanol 2G é a eficiência na conversão de celulose e hemicelulose em etanol, por serem polímeros de difícil decomposição (hidrólise). O processo requer a retirada da lignina, polímero resistente que compõe os resíduos fibrosos, e a hidrólise da celulose e da hemicelulose em açúcares simples, que podem ser convertidos em etanol pela levedura. Esses processos são caros, consomem muita energia e podem gerar subprodutos altamente inibitórios que atrapalham a capacidade fermentativa das leveduras responsáveis ​​pela produção desse álcool.

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“A produção de etanol 2G ainda precisa ser otimizada para aumentar sua eficiência. Uma das abordagens necessárias para essa otimização é identificar leveduras que resistam à ‘deterioração’ de moléculas inibitórias derivadas do processamento desses resíduos”, explica o biólogo Marcelo Mendes Brandão, pesquisador do Centro de Biologia Molecular e Engenharia Genética (CBMEG) da Unicamp. . “Já se sabe que algumas cepas de leveduras industriais apresentam maior tolerância a esses compostos. Um exemplo bem documentado é a levedura industrial Saccharomyces cerevisiae SA-1, cepa industrial brasileira de etanol combustível que demonstrou alta resistência a inibidores produzidos pelo pré-tratamento de complexos celulósicos e foco de nosso estudo publicado na Relatórios Científicos“, ele adiciona.

As análises estão alinhadas com a proposta do Projeto Temático FAPESP “Uma abordagem integrada para explorar um novo paradigma para a produção de biocombustíveis a partir de matérias-primas lignocelulósicas”. , coordenado por Telma Franco, da Faculdade de Engenharia Química da Unicamp. O trabalho do grupo também recebeu financiamento por meio de outros quatro projetos (18/17172-2, 11/00417-3, 18/01759-4 e 19/13946-6).

Metodologia

Os experimentos foram realizados por Dielle Pierotti e Felipe Ciamponi, então doutorandos, em colaboração entre os laboratórios coordenados por Thiago Olitta Basso, do Departamento de Engenharia Química da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), e Brandão, do CBMEG-Unicamp.

“Para contextualizar onde esse trabalho se encaixa na pesquisa de etanol 2G, já sabíamos que certas linhagens de S. cerevisiae eram resistentes a essas moléculas com atividade inibitória, mas o mecanismo molecular utilizado por essas leveduras para resistir a tais inibidores é complexo, envolvendo múltiplos processos e vias regulatórias”, detalha Basso.

Segundo o cientista da USP, outro ponto que sustentou a publicação é que um dos principais subprodutos resultantes do processamento do bagaço da cana-de-açúcar na produção do etanol 2G é o ácido p-cumárico (pCA), um dos principais inibidores presentes no o bagaço após tal processamento. “Dados disponíveis na literatura indicam que esse produto químico geralmente inibe o crescimento de S. cerevisiae e, consequentemente, diminui seu desempenho na produção de etanol.”

A equipe decidiu usar uma abordagem de bioinformática para integrar dados “multiômicos” no estudo. Ou seja, reuniu dados da transcriptômica – estudo do conjunto de mRNA, ácido ribonucléico mensageiro, produzido por um organismo em determinado momento – com dados da fisiologia quantitativa. “Isso nos permitiu entender melhor como essa levedura respondia ao ambiente de cultivo”, diz Brandão. Com os dados em mãos, o estudo se concentrou na caracterização molecular e fisiológica da resposta geral da levedura a um inibidor relevante para o processo que utiliza o bagaço de cana como matéria-prima para a produção de etanol 2G.

Os experimentos biológicos foram conduzidos por Pierotti e Ciamponi no Laboratório de Bioprocessos (BELa) do Departamento de Engenharia Química da Poli-USP. Os experimentos foram realizados utilizando cultivos contínuos em biorreatores (quimiostatos). Tais culturas garantem um ambiente muito bem controlado e definido para os microrganismos avaliados, onde é possível estudar o efeito do inibidor sobre os aspectos fisiológicos e genéticos destes microrganismos, sem a interferência de outras variáveis ​​que dificultam a interpretação das alterações na expressão/transcrição de genes nestes microrganismos. microorganismos. Assim, a levedura SA-1 foi cultivada em quimiostatos anaeróbios, na presença e ausência do inibidor (pCA). Dessas culturas, amostras foram coletadas em estado estacionário para determinação de parâmetros fisiológicos e parte do material biológico foi enviado a Taiwan para sequenciamento de RNA.

Os resultados foram analisados ​​no Laboratório de Biologia Integrativa e Sistêmica do CBMEG. Eles mostram que os mecanismos biológicos usados ​​por S. cerevisiae SA-1 para sobreviver sob a influência desses inibidores é muito mais complicado do que se pensava anteriormente. Dados fisiológicos quantitativos sugerem que o estresse pCA pode induzir maior atividade celular na linhagem SA-1 em condições anaeróbicas (relevantes para o processo industrial), com aumento da taxa de absorção de açúcar e produção de etanol.

O Brasil tem avançado nas pesquisas para um melhor aproveitamento da biomassa disponível em sua biodiversidade para a produção de bioprodutos, aqueles bens de consumo que podem ser construídos/montados/produzidos a partir da transformação de parte de um organismo, como é o caso dos tecidos e vegetais fibras, ou como resultado do metabolismo desses seres vivos. “Neste último caso, podemos citar a produção de álcool combustível, mercadoria com grande impacto na economia nacional”, aponta Brandão.



Fonte: Noticias Agricolas

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