Por Ricardo Brito e Maria Carolina Marcello
BRASÍLIA (Reuters) – A equipe do novo governo e aliados do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva tentam estabelecer na chamada PEC de Transição o prazo mais longo para o Bolsa Família ficar fora do teto de gastos em meio às incertezas sobre o que terá que ser feito. cedem para aprovar a proposta na Câmara e no Senado, segundo fontes envolvidas nas negociações ouvidas pela Reuters.
A minuta da PEC foi apresentada nesta quarta-feira à lideranças parlamentares pelo coordenador-geral da transição, vice-presidente eleito Geraldo Alckmin (PSB), retirando definitivamente o programa social do teto, deixando claro que caberá ao Legislativo dar a palavra final sobre os termos da PEC.
Mas, segundo duas fontes familiarizadas com as negociações, aliados da nova gestão admitem que terão que ceder durante as negociações e definir prazo para a exceção ao teto para que a PEC avance até meados de dezembro a tempo de ela entrar em vigor promulgada pelo Congresso ainda este ano. e evitar a interrupção do pagamento do benefício social no valor de 600 reais.
Por se tratar de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), a medida precisará do apoio de três quintos das duas Casas Legislativas.
Segundo uma das fontes, a equipe de transição visa a manutenção do pagamento dos 600 reais do Bolsa Família, além da parcela extra de 150 reais por criança de até 6 anos, para ficar fora do teto por quatro anos, período que compreenderia todo o terceiro mandato de Lula.
Esse prazo reduziria o poder de barganha de partidos como PSD, PP e oposicionista PL –onde os deputados defendem um ano de vigência–, pois não seria necessário negociar, por exemplo, uma nova PEC na próxima ano para entrar em vigor em 2024.
O tempo é curto para esse arranjo porque, além de gastar capital político para aprovar a PEC da Transição, também será preciso correr para aprovar o projeto de lei orçamentária de 2023, que listará os bilhões que permitirão novos gastos, como recomposição de despesas com saúde, educação, habitação e outras obras públicas.
As negociações também acontecem diante de uma forte reação do mercado às declarações de Lula sobre a necessidade de cumprimento das regras fiscais em detrimento dos gastos sociais ao defender que algumas despesas devem ser consideradas investimentos. Há também rumores sobre a condução econômica do próximo governo e dúvidas sobre a âncora fiscal adotada para substituir o teto de gastos.
O relator-geral do Orçamento do ano que vem, senador Marcelo Castro (MDB-PI), deixou claro que a intenção é primeiro negociar os termos e detalhes do texto para depois começar a colher assinaturas – são necessárias pelo menos 27. O parlamentar, que deve ser o primeiro signatário da PEC, respondendo por sua autoria, calcula que ela poderá ser votada pelo Senado até o fim deste mês.
“A PEC, uma vez apresentada, vai para a CCJ… o mais difícil aqui no Senado não é a tramitação; é a gente chegar a um entendimento de qual seria o texto mais adequado”, disse Castro na quarta-feira, após receber a minuta da proposta das mãos de Alckmin.
O senador eleito Wellington Dias (PT-PI), indicado por Lula para coordenar as negociações do Orçamento do próximo ano, disse nesta quinta-feira que “a partir de agora há um esforço das lideranças da Câmara e do Senado porque temos um prazo curto e ao mesmo tempo a necessidade de garantir um texto para o Bolsa Família em que, aprovado no Senado, também já pactuado, também tenha condições de aprovação na Câmara”.
RELATÓRIO
Uma das incógnitas entre os aliados de Lula, segundo uma das fontes, é o papel que o presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado (CCJ), Davi Alcolumbre (União-AP), terá na tramitação da proposta.
Ex-aliado do presidente derrotado Jair Bolsonaro (PL), Alcolumbre, que já deu sinais de ser favorável à retirada do Bolsa Família do teto por apenas um ano, pode vir a destituir a relatoria da PEC, segundo fonte do O senado.
Segundo a assessoria de imprensa, Alcolumbre só definirá a relatoria quando a PEC for apresentada. O senador já se comprometeu a agilizar a tramitação da proposta.
A preferência inicial da equipe de transição era que o relator fosse Marcelo Castro, o que poderia facilitar o entendimento da proposta junto com o Orçamento para o ano que vem, já que o senador é aliado de Lula e relator da peça orçamentária.
O líder do governo Bolsonaro no Senado, Carlos Portinho (PL-RJ), disse estar disposto a dialogar para manter o Auxílio Brasil – que voltará a se chamar Bolsa Família – em 600 reais. Mas, citando preocupação com a situação fiscal, disse achar difícil que seja uma medida extraprotetora, e por um período de quatro anos.
“Não adianta dar o aumento e causar inflação, aumento dos juros. Tudo isso vai corroer o preço de compra. Ou seja, não vai ter ganho. Também estamos abertos a debater o salário mínimo. Mas precisamos de um ministro para avaliar os impactos de todas essas propostas para saber como se dará a recuperação ao longo do ano. Não pode ser um cheque em branco”, afirmou, em nota.
Portinho já foi procurado pelo líder do PT no Senado, Paulo Rocha (PT-PA), que participa do mutirão para conversar sobre a PEC com todos os envolvidos. Segundo o petista, Portinho teria pedido detalhes e valores da PEC, algo que, lembra Rocha, caberá ao relator quando começar a trabalhar na proposta.
“O detalhamento é responsabilidade do relator. O relator, quando discutir esse assunto, naturalmente vai apresentar o detalhamento a todos”, disse Rocha a jornalistas na noite desta quinta-feira.
Outra indefinição diz respeito ao papel e ao compromisso que o prefeito Arthur Lira (PP-AL) terá e dará à tramitação da PEC quando chegar à Câmara, segundo fonte da equipe de transição. Lira, que recebeu a minuta na véspera, ainda não indicou se apoiaria a prorrogação do benefício social por quatro anos. Também não está definido quem poderá ser o relator da PEC na Câmara.
Fonte sênior do Congresso avaliou que o clima na Câmara e em seu presidente ainda é de espera, embora as conversas sobre a PEC já estejam a todo vapor. Não se fala, porém, em números ou no prazo de validade da exceção ao teto de gastos.
A probabilidade, porém, é que a medida seja aprovada, mesmo entre aliados do atual governo e mesmo que com relutância, dado o custo político de negar aos mais vulneráveis o benefício de 600 reais.
(Reportagem adicional de Victor Borges)