Uma parceria público-privada entre a Embrapa e a empresa Lallemand Plant Care coloca no mercado o inseticida biológico Lalguard Java, uma alternativa sustentável para o controle da mosca-branca (Bemisia tabaci), praga que causa danos a mais de 40 lavouras no Brasil. O inseto é responsável por danos diretos (sucção de seiva, injeção de toxinas e distúrbios fisiológicos) e indiretos, devido à excreção de uma substância açucarada, que favorece o crescimento de fungos nas folhas. Além disso, é vetor de diversas doenças transmitidas por vírus em plantas. A mosca-branca é resistente a vários inseticidas químicos sintéticos, o que torna o manejo difícil e caro.
O Lalguard Java foi formulado a partir de uma cepa do fungo Cordyceps javanica, que demonstra eficiência no controle de ninfas (forma jovem) e mosca-branca adulta, principalmente por seu comportamento classificado como “caçador” (cresce extensivamente a partir de insetos mortos e infecta outros insetos no folhas), o que resulta em alta mortalidade de pragas. Aliado a isso, é inofensivo para humanos e outros vertebrados e tem baixo impacto sobre insetos benéficos, que atuam como inimigos naturais de pragas no campo. Ao contrário dos pesticidas químicos, o Lalguard Java é ecológico e não deixa resíduos nos alimentos.
O bioproduto é resultado de uma pesquisa iniciada em 2012 e que envolveu especialistas da Embrapa. Houve um trabalho de coleta do fungo em áreas com alta mortalidade natural de mosca-branca nas lavouras de soja, feijão, milho, goiaba, tomate e algodão, nos estados de Goiás e Maranhão, e no Distrito Federal.
As cepas do fungo coletadas de ninfas e adultos de mosca-branca no campo foram isoladas em meio de cultura para dar início à pesquisa. Após essa etapa, foi realizada a análise molecular via sequenciamento genético para determinar as espécies presentes nas amostras, quando foram identificadas 11 cepas do fungo Cordyceps javanica. O próximo passo foi testar essas amostras quanto ao grau de eficácia no controle da mosca-branca em experimentos de laboratório, casa triada e de campo. O resultado desses trabalhos foi a seleção da cepa BRM 27666 de Cordyceps javanica.
Além de estabelecer um zoneamento climático favorável para a cepa selecionada, também foi avaliada sua compatibilidade com mais de 30 produtos comerciais comumente utilizados no cultivo, incluindo adjuvantes, inseticidas, fungicidas e herbicidas. O objetivo foi testar se havia algum efeito tóxico de produtos químicos sintéticos sobre a eficiência do componente fúngico (esporos ou conídios) no controle da mosca-branca.
O BRM 27666 apresentou eficácia em ambientes com alta ou baixa umidade, o que é um ponto positivo para sua aplicação em lavouras. Além disso, essa cepa se multiplica dentro do hospedeiro, produzindo muitos esporos, que são as estruturas de disseminação do fungo, e pode se espalhar pelo vento, chuva ou pelo próprio inseto, causando novas infecções.
Estratégia de gestão integrada
Em 2015, foi firmada uma parceria com a empresa canadense Lallemand Plant Care, com sede no Brasil, em Patos de Minas (MG), que foi responsável por transformar todo o conhecimento gerado em um bioproduto. É uma formulação em pó molhável, aplicada via pulverização foliar, que contém conídios do fungo, ou seja, estruturas germinativas, que penetram na mosca-branca por contato, sem a necessidade de ingestão, aspecto importante, pois não depende de alimentação de insetos para infecção.
Segundo o fabricante Lallemand Plant Care, o Lalguard Java tem um bom prazo de validade, ou seja, cerca de um ano, se armazenado em condições adequadas e com temperatura controlada.
A entomóloga da Embrapa Eliane Quintela, uma das responsáveis pela pesquisa que deu origem ao produto, explica que o novo bioinseticida foi testado em todas as safras (verão, seca e inverno) para controlar a mosca-branca em lavouras atacadas pela praga. Segundo ela, é mais uma opção às limitadas estratégias de controle desse inseto.
“Este bioinseticida protege as plantas, não deixa resíduos nos alimentos e é compatível com outros inseticidas, herbicidas e adjuvantes. O produto também reduz a possibilidade de resistência à mosca-branca e tem baixo impacto sobre os insetos benéficos às lavouras, sendo uma alternativa aos defensivos químicos convencionais”, acrescenta Quintela.
Ela destaca o potencial do novo insumo como ferramenta a ser incorporada aos programas de Manejo Integrado de Pragas (MIP) em culturas de importância socioeconômica para o Brasil, como algodão, soja, feijão, tomate, batata, melão, melancia e plantas ornamentais, entre outras. outras. “A perspectiva de utilização do Lalguard Java deve estar alinhada ao conjunto de práticas de MIP que visam manter o equilíbrio populacional da mosca-branca no campo, agregar rotação de culturas e cultivares, monitorar insetos nas lavouras e observar os períodos de vazio sanitário estabelecidos em cada local do país, onde as plantas hospedeiras da mosca-branca não podem ser cultivadas”, conclui Quintela.