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agricultura de precisão ajuda a produzir vinhos diferenciados

    agricultura de precisao ajuda a produzir vinhos diferenciados

    Na rota do vinho paulista, no interior do estado, a mais de 700 metros de altitude, um vinhedo está colhendo os resultados da aplicação da viticultura de precisão. A constatação de pesquisadores brasileiros de que a variação dos atributos do solo e das plantas ocorre mesmo em pequenas áreas de um vinhedo permitiu a colheita seletiva de uvas ‘Syrah’ e a obtenção de vinhos finos de inverno com características distintas.

    A variabilidade espacial e temporal em pequenos vinhedos foi confirmada em pesquisa realizada pela Embrapa Instrumentação (SP) na vinícola Terras Altas (Ribeirão Preto, SP), em parceria com a Faculdade de Ciências Agronômicas (FCA) da Universidade Estadual Paulista (Unesp). ), em Botucatu (SP), e o Centro Tecnológico da Uva e do Vinho da Epamig, em Caldas (MG).

    Conduzido no modelo on farm research, que permite o estudo direto na quinta, durante o ciclo da cultura da vinha para o vinho, o trabalho avaliou dois anos de produção de uva – 2020 e 2021 – em sistema de dupla poda. Nela, é realizada uma poda em agosto para indução do ciclo vegetativo e outra entre janeiro e março, para indução do ciclo produtivo e colheita das uvas no inverno.

    “É um trabalho inédito em nossas condições de produção. E complementa a técnica de produção de poda dupla, aprimorada por pesquisadores da Epamig”, afirma o diretor da vinícola Terras Altas, agrônomo Ricardo Baldo.

    Uvas e vinhos com características diferentes

    Em ambos os anos, os vinhos de inverno ‘Syrah’ apresentaram algumas características distintas dependendo das duas zonas de manejo delimitadas, denominadas Z1 e Z2, e de acordo com os dois porta-enxertos adotados: ‘Paulsen 1103’ e ‘IAC 572’.

    Em ambos os ciclos de produção da uva, o número de cachos, peso total por planta e peso médio dos cachos, sólidos solúveis, potencial hidrogeniônico (pH), antocianinas (pigmentos vegetais responsáveis ​​pela cor do vinho) e compostos fenólicos (que conferem adstringência , cor, sabor e aroma) nas sementes foram maiores em Z2. Os compostos fenólicos nas conchas foram maiores em Z1.

    Os vinhos do porta-enxerto ‘Paulsen 1103’ apresentaram maior acidez volátil nas duas zonas de manejo em 2020, enquanto o ‘IAC 572’ deu aos vinhos maior pH e teor de antocianinas, e poder antioxidante em Z2.

    Em 2021, os vinhos da Z1 apresentaram maior teor alcoólico e açúcar, maior pH e tonalidade. Os vinhos elaborados com uvas Z2 apresentaram maior concentração de antocianinas, maior teor de polifenóis totais – substâncias que influenciam o sabor e a cor do vinho e são benéficas para a saúde – e maior intensidade.

    “As informações são estratégicas para a viticultura de precisão e manejo do vinhedo, pois a partir delas o viticultor pode tomar decisões quanto à conduta diferenciada das práticas agrícolas utilizadas no cultivo da uva. Uma delas é a colheita seletiva”, diz o pesquisador da Embrapa Luís Henrique Bassoi.

    Segundo ele, a adoção dessa prática pode levar a vinhos com características diferentes e de interesse da vinícola. “Os resultados da pesquisa têm impacto direto na qualidade do vinho e podem, sem dúvida, contribuir para o aumento da qualidade do produto nacional”, reforça Baldo.

    A pesquisa orientada por Bassoi foi conduzida pela agrônoma Larissa Godarelli Farinassi (foto à direita), da FCA Unesp, para a obtenção do doutorado em Irrigação e Drenagem. Ela investigou a influência da variabilidade espacial em vinhedos irrigados na qualidade da uva e do vinho de inverno ‘Syrah’.

    “Utilizámos os resultados de estudos nas nossas vinhas, a vindima seletiva de determinadas áreas das vinhas já se tornou uma realidade. Os ganhos de qualidade já são visíveis em campo e estarão no copo do nosso consumidor”, afirma Baldo.

    Vinificação de precisão

    A viticultura de precisão é a adoção de procedimentos e o uso de equipamentos e sensores para a prática da agricultura de precisão (AP) em um sistema de produção de uvas viníferas.

    Essa forma de manejo da área de produção de uva possibilita caracterizar a variabilidade espacial e temporal do solo e da planta, além de auxiliar na execução de práticas agrícolas de forma diferenciada no vinhedo. No caso específico da pesquisa na adega Terras Altas, foi adotado o sistema de poda dupla, fazendo com que as uvas fossem colhidas para vinificação durante o inverno.

    Segundo Bassoi, os próximos passos da pesquisa envolvem análises da variabilidade espacial e temporal entre os vinhedos.

    hipótese comprovada

    Os investigadores partiram da hipótese de que a variabilidade dos atributos do solo e da vinha numa mesma vinha poderia levar a características diferentes nas uvas e nos vinhos produzidos a partir delas.

    Assim, a variabilidade espacial do vinhedo irrigado por gotejamento foi caracterizada a partir da delimitação de duas zonas de manejo. Em um deles, a avaliação foi relacionada aos atributos do solo – condutividade elétrica aparente e umidade. Na outra, a avaliação foi focada nos índices planta – vegetação.

    Além disso, os pesquisadores avaliaram se as zonas de manejo diferem entre si quanto aos atributos químicos e físico-hídricos do solo, bem como em relação aos aspectos produtivos, quantitativos e qualitativos das uvas e a composição dos vinhos. , nos ciclos de produção investigados. .

    Como se suspeitava, a variabilidade espacial e temporal da vinha pertencente à adega Terras Altas, observada em duas zonas de gestão, ocorreu mesmo em pequenas áreas da unidade de produção.

    Culturas mais seletivas

    Farinassi explicou que as zonas de manejo também permitem avaliar diferenças nos atributos físico-hídricos do solo. “Os valores de umidade do solo, em função da irrigação realizada e das chuvas ocorridas, foram maiores em Z2 nas profundidades de 0,4 a 1,0 metros. A diferença observada entre as zonas de manejo 1 e 2 se aprofundou em ambos os ciclos de produção”, confirma o pesquisador.

    Para Ricardo Baldo, o projeto desenvolvido em parceria com a Embrapa é muito importante, considerando que o foco de produção da empresa é totalmente voltado para a qualidade do vinho.

    “Conhecer em profundidade as características de cada vinha e delinear as áreas de melhor produção em relação à qualidade da fruta faz-nos trabalhar com colheitas mais seletivas, privilegiando o tipo de uva mais adequado para cada perfil de vinho a produzir”, observa o diretor.

    Outra vinícola em que a pesquisa também é realizada é a Casa Verrone (Itobi, SP). De acordo com seu diretor-proprietário, Márcio Vedovato Verrone, o estudo trouxe informações que subsidiarão futuras decisões e estudos em outras áreas.

    “Este ano, por exemplo, foi necessário entrar na vinha onde está a ser feito o trabalho de pesquisa para uma colheita antecipada. De acordo com os resultados obtidos pela pesquisa em anos anteriores, tomamos a melhor decisão sobre qual parte colher primeiro”.

    O conhecimento da variabilidade do vinhedo está auxiliando a instalação do sistema de irrigação por gotejamento na adega, na definição dos setores do sistema de irrigação, para aplicação de lâmina de água variada, se necessário.

    A pesquisa também conta com o apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

    Microvinificação
    Com base nos dados das zonas de manejo, foram realizadas colheitas seletivas de inverno de uvas ‘Syrah’ em julho de 2020 e julho de 2021.

    As uvas foram encaminhadas ao Centro Tecnológico da Uva e do Vinho da Epamig, para microvinificação – processo de fabricação de vinho em pequena escala – e determinação de parâmetros como pH, acidez total, açúcar, alcalinidade, entre outros.

    Para a coordenadora do Programa Estadual de Pesquisa em Viticultura da Epamig, Renata Vieira da Mota, a viticultura de precisão é uma importante ferramenta de pesquisa, pois contribui para o conhecimento detalhado do vinhedo e fornece informações que ajudam a explicar o comportamento fisiológico da planta. .

    “A viticultura de precisão é essencial quando pensamos na produção de vinhos finos de melhor qualidade, pois o conhecimento das características das uvas em cada parcela permite ao enólogo produzir produtos diferenciados a partir da colheita seletiva das uvas, trazendo maior valor agregado ao o vinho”, avalia o coordenador.

    Potencial vitícola

    De acordo com o zoneamento pedoclimático realizado por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), mais de 70% do estado de São Paulo tem aptidão cultivo. da videira.

    No entanto, de acordo com o estudo, o potencial vitícola regional é mais acentuado nas épocas de outono e inverno, quando as condições climáticas são favoráveis ​​à maturação das uvas.

    De acordo com a Associação Nacional dos Produtores de Vinhos de Inverno (Anprovin), 13 vinícolas adotam a técnica de poda dupla no estado de São Paulo, produzindo vinhos de inverno em uma área de 60 hectares.

    emprego e renda

    “O impacto socioeconômico das vinícolas vem aumentando, principalmente devido aos projetos que envolvem o enoturismo. Há exemplos bem-sucedidos de vinícolas que agregaram espaços para visitar e receber turistas, promovendo negócios e gerando empregos”, afirma o gerente executivo da Anprovin, Matheus Cassimiro.

    Segundo ele, o cálculo da criação de emprego no campo é de um funcionário por hectare, sem contar os espaços de enoturismo, se houver. “Isso exige a contratação de mão de obra na área de atendimento, com treinamento para recepção ao público e até conceitos hoteleiros. Esses espaços atraem renda não só para os próprios moradores, mas também para os municípios”, afirma o gerente-executivo.

    No Brasil, segundo a Anprovin, o cultivo da videira para a safra de inverno ocorre em 267 hectares, o que permite obter 400 mil litros de vinho por ano e 500 mil garrafas, produzidos por 35 associados presentes em cinco estados. Brasileiros – Bahia, Goiás, Minas Gerais, Mato Grosso e São Paulo.



    Fonte: Agro